Enfermeiros por amor

No dia-a-dia, a profissão dos enfermeiros e técnicos de enfermagem exige jogo de cintura, paciência e agilidade

Por Aline Christina Brehmer 10/05/2019 - 10:02 hs
Foto: Marcelo Dias/Jornal Café Impresso

Mais um dia aparentemente normal de atendimentos na Unidade Básica de Saúde (UBS) do bairro Nações. Luciana Butzke Marconcini, uma das chefes de enfermagem, realizava os atendimentos em sua sala. Na outra sala está Afonso, que é o outro chefe enfermeiro da unidade.

A próxima paciente da Luciana, que exerce a profissão há 33 anos, era uma adolescente que apresentava sangramento intenso. “Ela achava que estava abortando, mas a questão é: sua mãe nem desconfiava dessa gravidez. Fiquei ali, em meio àquela situação difícil, tentando ajudar uma jovem de 15 anos que estava perdendo seu bebê e, enquanto isso, havia 16 pessoas me esperando do lado de fora para serem atendidas”, relembra.

Em meio à pressão, Luciana respirou fundo e percebeu que o momento exigia calma. Primeiro, conversou com a adolescente e entrou em contato com o médico (que é o profissional responsável por ligar para o Pronto Socorro (PS)).

Em seguida, chamou o psicólogo para conversar com a garota e sua mãe. “Um atendimento que era para ser rotineiro teve diversos desdobramentos e demorou mais de uma hora. O problema é que quem está ali fora não entende o que está acontecendo na minha sala. Aqui a gente lida com sofrimento humano. Não é uma conta pronta como 2+2 = 4, nunca sabemos qual vai ser o resultado, como resolver determinadas situações”, desabafa Luciana.

Situações difíceis

Diante da comemoração do Dia Internacional da Enfermagem celebrado neste domingo, dia 12, essa é apenas uma das tantas situações que os enfermeiros e técnicos de enfermagem, além dos demais funcionários da UBS, lidam diariamente em Timbó. Luciana conta que hoje há 6.700 pessoas cadastradas somente na unidade do bairro das Nações. Durante o período de férias entre 2018 e 2019, foram realizados 600 novos cadastros.

Hoje a UBS Nações conta com duas equipes de atendimento, composta por um enfermeiro, dois técnicos de enfermagem e um médico cada, um psicólogo, uma dentista e seis agentes comunitárias.

A expectativa é que, após o concurso que está sendo realizado pela Prefeitura Municipal de Timbó, mais profissionais integrem o quadro.

Demandas: Espontânea e Programada

Com uma equipe considerada pequena diante dos 250 atendimentos que realiza todos os dias, Luciana garante que os profissionais dão conta do recado. “Temos duas formas de atendimento: a demanda programada e espontânea”, diz.

No primeiro caso, se trata das pessoas que agendam uma consulta – entretanto, o número de faltantes preocupa. “Se a gente tem oito atendimentos agendados para aquele dia e uma pessoa falta, acaba tirando a vez de quem precisa. Sempre que possível, a gente faz os “encaixes”, que são aquelas situações onde o paciente precisa de um atendimento urgente”, esclarece.

A segunda forma de atendimento é a demanda espontânea. “A nova Política Nacional de Atenção Básica menciona muito uma nova modalidade de atenção ao Acesso Avançado, que é quando o paciente chega na unidade em busca de soluções para seu problema de saúde, exigindo um atendimento integral. Para cada pessoa seu problema é a prioridade naquele momento, mas há situações e situações, então a gente combinou, entre o pessoal da equipe, de fazer esse acolhimento junto a uma triagem”, explica.

Nessa triagem a pessoa seria então recepcionada, tendo sua pressão e temperatura aferidas, assim como seus sinais vitais. Em seguida, é encaminhada para uma das equipes de enfermagem (com a Luciana ou o Afonso), onde é feita a escuta.

“É um procedimento no qual a gente vê se consegue resolver ou é preciso de atendimento médico. Há ainda casos em que é possível fazer o agendamento”, complementa a enfermeira.

O perigo dos mal-entendidos (e da desinformação)

Em meio a essa correria para administrar os encaixes e atendimentos, além de gerenciar e coordenar todas as atividades da UBS, Luciana conta que há ainda os momentos em que é preciso manter a calma em meio às situações de mal-entendido.

“Lembro de algo que aconteceu na Campanha de Vacina neste ano. Uma criança veio tomar sua dose, mas saiu daqui com quatro picadas – isso porque havia vacinas em atraso e nós temos a obrigação de deixar a carteira de vacinação em dia”, relata a enfermeira.

Luciana diz que cada uma das vacinas, antes de serem aplicadas, tinham suas finalidades explicadas à mãe, para ela saber do que se tratava. Em seguida, mãe e filho foram para casa – mas pouco tempo depois quem veio até na UBS foi o avô da criança.

“Ele chegou alterado, despejando agressões verbais contra todos da equipe, falando em tom de ameaça. Expliquei para ele que o Ministério da Saúde nos obriga a deixar em dia as vacinações das crianças e que, se o neto dele saísse daqui sem uma das doses de vacina e ficasse doente, quem iria responder por isso seria o técnico que deixou de imunizar a criança contra determinada doença. Demorou para ele entender, mas no final compreendeu a situação e que o que fizemos foi pelo bem do seu neto, mas situações assim, que arriscam “fugir do controle” devido à desinformação das pessoas, infelizmente são comuns”, desabafa Luciana.

Motivação diária

Mas, se por um lado há os momentos difíceis, pelo outro há aqueles que motivam diariamente cada funcionário da unidade. “É raro, mas acontece de ter uma pessoa que está aguardando chegar sua vez de ser consultada e então aparece alguém doente ou com um bebê que está com febre e essa pessoa, que está ali esperando, cede sua vez por entender que a situação de quem está ao seu lado é prioridade. O que falta muitas vezes é empatia e compaixão. Há muitas pessoas que são egoístas, essa é a palavra”, reflete a enfermeira.

“Às vezes são as coisas mais simples, como desejar um bom dia, bom fim de semana, uma ótima semana são coisas que a gente ouve pouco, mas quando alguém diz, ganhamos o dia. Sabemos o quanto podemos impactar e transformar a vida das pessoas, e quando você percebe que conseguiu resolver aquela situação, ajudar alguém, não existe sensação mais gratificante”, reflete Luciana, deixando a todos os colegas de profissão um parabéns especial pelo seu dia.